Em novo consenso de cientistas, IMC deixa de ser decisivo para definir obesidade; entenda
Estudo divulgado na revista The Lancet passa a estabelecer outros parâmetros, como circunferência da cintura, exames e sintomas
Cientistas reunidos em uma comissão global estão propondo uma nova forma de definir o que é obesidade. Deixa-se de considerar apenas o Índice de Massa Corporal (IMC), considerado insuficiente pelos médicos e passa-se a analisar também a circunferência da cintura com relação a outros tamanhos, como quadril e altura, e a medição direta da gordura corporal por meio de exames.
Este novo paradigma sobre a aferição da obesidade foi divulgado nesta terça-feira (14) pela revista científica The Lancet, uma das mais prestigiadas na medicina, tendo sido endossado por 75 organizações médicas ao redor do mundo. Os pesquisadores envolvidos também introduzem dois novos conceitos: obesidade pré-clínica, quando há gordura em estágio que ainda não apresenta maiores riscos à saúde, e obesidade clínica, quando o bem-estar do paciente já está comprometido.
Segundo o médico endocrinologista Tiago Schuch, um dos coordenadores do Ambulatório Multidisciplinar de Obesidade e Cirurgia Bariátrica do Hospital Moinhos de Vento, o estudo induz a uma avaliação mais criteriosa da obesidade, analisando parâmetros como o tamanho do corpo, a localização do excesso de gordura e eventuais complicações.
Não são todas as pessoas com IMC alto que têm excesso de gordura corporal e risco de ficar doente. Assim como não é todo mundo que tem IMC normal que deixa de ter excesso de gordura corporal. Por isso foi criado esse novo consenso. A ideia é refinar melhor onde está o excesso de gordura e o que isso significa risco para saúde
TIAGO SCHUCH
Um dos coordenadores do Ambulatório Multidisciplinar de Obesidade e Cirurgia Bariátrica do Hospital Moinhos de Vento
Como a obesidade é definida hoje
Atualmente, a aferição da obesidade é feita com o IMC, um cálculo baseado na divisão do peso pela altura ao quadrado. É uma ferramenta considerada insuficiente porque não aponta se há gordura e não avalia como essa gordura está distribuída no corpo, observa o médico endocrinologista Mateus Dornelles Severo, diretor da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), regional Rio Grande do Sul.
— O IMC mede a massa corporal, não consegue saber o que é massa óssea e, principalmente, o que é gordura. Também não diz onde há mais gordura e não dá uma ideia do estado de saúde da pessoa — diz.
Um bom exemplo de como o IMC pode chegar a diagnósticos equivocados são os atletas com muita massa corporal.
Um atleta que faz exercício de força e por causa disso tem muita massa muscular pode, usando apenas o IMC, ser apontado como alguém que tem sobrepeso ou até obesidade. Sendo que, na verdade, sua gordura corporal é baixa. O que ele tem é massa muscular. Dar um rótulo errado para um paciente tem um impacto negativo na sua vida
MATEUS DORNELLES SEVERO
diretor da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), regional Rio Grande do Sul
Como passa a ser
A nova forma de classificar a obesidade considera não só o IMC, mas uma estimativa da gordura corporal do paciente e sua distribuição pelo corpo. Chega-se a isso tirando a medida da cintura do jeito mais simples, com fita métrica. Também pode ser feita a relação cintura-quadril ou cintura-altura. Também podem ser considerados exames como densitometria (Dexa) ou bioimpedância.
A distribuição da gordura na cintura passa a ganhar importância com esse novo consenso.
— A cintura dá uma uma estimativa da gordura visceral, aquela gordura dentro da cavidade do abdômen, envolvendo os órgãos. Essa gordura se associa a complicações metabólicas, como elevação da glicose, gordura no fígado, risco de doenças cardiovasculares. É uma gordura mais prejudicial para o organismo do que a gordura que está embaixo da pele, que chamamos de subcutânea. Por isso é importante avaliarmos a distribuição da gordura —explica Severo.
Considerando essas ferramentas de aferição e chegando-se ao resultado de obesidade, o médico pode chegar a dois diagnóstico: obesidade pré-clínica, que vai exigir tratamento, mas não há manifestação de disfunções orgânicas, e obesidade clínica, que exige mais atenção porque já há complicações.
— Hoje, não temos esse termo “obesidade clínica”. É uma forma de identificar quem está doente por causa da obesidade — diz Schuch.
O médico reforça que o IMC não será descartado a partir dessa nova forma de aferir a obesidade:
— Se houver um IMC alto, haverá associação dessas outras medidas, como avaliação da circunferência abdominal, razão cintura-quadril ou cintura-altura, etc.
Critérios para diagnóstico de obesidade clínica:
Para se chegar ao diagnóstico de obesidade clínica em adultos, o estudo apresentado na The Lancet estabelece 18 critérios, entre eles:
- Falta de ar causada pelos efeitos da obesidade nos pulmões
- Insuficiência cardíaca induzida pela obesidade
- Dor nos joelhos ou quadris, com rigidez articular e redução da amplitude de movimento, como efeito direto do excesso de gordura corporal nas articulações
- Certas alterações ósseas e articulares em crianças e adolescentes que limitam o movimento
- Outros sinais e sintomas causados por disfunções de órgãos como rins, vias aéreas superiores, sistemas metabólicos, nervoso, urinário, reprodutivo e linfático nos membros inferiores
Fonte: Gaúcha ZH