Serra Gaúcha concentra 80% das vinícolas do Rio Grande do Sul

O vinho do futuro já é desenvolvido na Região da Serra Gaúcha. Manejo, irrigação e tecnologia integram ações para aprimorar produto e superar adversidade climática

Os eventos extremos provocados pelas mudanças climáticas, que tendem a ser mais potentes e frequentes, deixam um dos setores mais típicos da economia da Serra Gaúcha muito atento. O vinho do futuro é assunto permanente na região que concentra 436 das 539 vinícolas ativas no Rio Grande do Sul, ou 80,8%. A estimativa da Emater é de que, de um total de 44 mil hectares de vinhedos no Estado, pelo menos 500 foram danificados pelos eventos de maio, e foi só um dos capítulos do que vem sendo analisado pelos especialistas nos últimos anos.
Em 2023, o Estado produziu, conforme a Secretaria Estadual da Agricultura, 457,79 milhões de litros de vinhos, sucos e mosto de uva. Um volume inferior ao que foi registrado nos dois anos anteriores. A fruta representa quase R$ 2 bilhões no valor bruto de produção do Rio Grande do Sul, mas o volume de uvas colhidas também caiu em 2024 na Serra.
Foram 664,9 mil toneladas colhidas em todo o Estado após o excesso de chuvas já no ano passado. Este, porém, não é exatamente um número que preocupe as principais vinícolas da região. A prioridade entre elas está no investimento na qualidade, e não necessariamente na quantidade de uvas.
“Temos aqui um produto que pode ter menor quantidade, mas tem alto valor agregado, e temos trabalhado na adaptação, sustentabilidade e melhoria deste produto”, diz o diretor superintendente da Miolo Wine Group, Adriano Miolo.
E aí, como explica a especialista do curso de Viticultura da Universidade de Caxias do Sul (UCS), a engenheira agrônoma Roberta Boscato, temas como a irrigação, ainda pouco comum neste recorte do Estado, tendem a se tornar realidade também na cultura da uva na Serra.
“A uva gosta de tempo menos chuvoso, mas se a temperatura chega a um grau a mais, já é um ambiente mais agressivo, e essa é uma tendência com as mudanças climáticas. Se não tiver irrigação, a área de cultivo pode secar. A videira resiste à seca, mas tem um limite. E quando falamos da produção de vinhos na Serra, estamos falando de vinhos finos, de alta qualidade e de variedades específicas, que precisarão de investimento direcionado para cada uma dessas variedades para manter o padrão no futuro“, avalia.

Na Cooperativa Vinícola Garibaldi, a aposta estratégica para o futuro é voltada ao espumante, a partir de uvas brancas, que têm maturação mais precoce. Hoje, em uma safra com volume considerado normal pela cooperativa, são produzidos até 20 milhões de litros. Metade deste volume, ainda é de suco, e outros 5 milhões de litros, de espumante. Uma estatística que tende a mudar.

“O mercado doméstico é o nosso principal foco, porque percebemos um crescimento no hábito do consumo de vinho no País. No Velho Mundo, há um consumo de até 30 litros per capita anualmente, no Brasil, chegamos a 2 litros. E quando falamos de espumantes, o potencial para o nosso produto no futuro é ainda maior. Hoje, são só 200 ml per capita de consumo anual no País”, diz o diretor administrativo da Cooperativa Garibaldi, Alexandre Angonezi.
Hoje, a Garibaldi tem 30% das suas vendas concentradas no Rio Grande do Sul, e o mercado externo garante 1% do faturamento. Mas, como aponta Angonezi, há espaço para o espumante gaúcho também no exterior. Neste ano, a cooperativa investe R$ 7,5 milhões em melhorias e ampliação da capacidade produtiva. Anualmente, diz o diretor, são R$ 5 milhões investidos na precisão dessa produção de alto nível mais adaptada às mudanças climáticas.
Em seu vinhedo experimental, por exemplo, a Garibaldi trabalha atualmente na pesquisa, em conjunto com uma cooperativa italiana, de 60 diferentes variedades de uvas mais resistentes e adaptáveis. A estrutura conta também com um laboratório para análise do que é plantado e colhido pela cooperativa.
“São, principalmente, plantas mais resistentes a doenças fúngicas, que é o que mais afeta as plantas em situações de estresse hídrico. Nesta última safra, por exemplo, passamos por um super El Niño que resultou em perda de 30% da safra. Para o próximo ciclo, há perspectiva de La Niña, que tende a ser favorável, mas também dependerá de fatores como as horas de frio. O processo de desenvolvimento de maior resiliência e adaptação nos vinhedos começou há 10, 15 anos. Avançamos em variedades mais adaptáveis ao nosso terroir, em conjunto com o manejo mais tecnificado, preciso e sustentável. Só assim conseguiremos, no nosso vinho do futuro, manter o padrão internacional que já alcançamos”, explica.

A produção de uvas e vinhos na Serra Gaúcha

– Serra concentra 436 das 539 vinícolas em funcionamento no Rio Grande do Sul
– Isso representa 80% das vinícolas em solo gaúcho
– Em 2024, o Estado colheu 664,9 mil toneladas de uvas, 20% inferior ao ano anterior
– Em 2023, o Estado produziu 457,79 milhões de litros de sucos, vinhos e mosto de uva, 6% a menos do que o ano anterior, e 21% a menos do que em 2021.

Produção de uvas de mesa por município (2024)
1º Caxias do Sul
2º Bento Gonçalves
3º Farroupilha
4º Vale Real
5º Flores da Cunha

Produção de uvas para a indústria (2024)
1º Flores da Cunha
2º Bento Gonçalves
3º Farroupilha
4º Caxias do Sul
5º Garibaldi

Produção de vinhos de mesa (2023)
1º Flores da Cunha
2º Farroupilha
3º Campestre da Serra
4º Bento Gonçalves
5º Caxias do Sul

Produção de vinhos finos (2023)
1º Bento Gonçalves
2º Farroupilha
3º Garibaldi
4º Flores da Cunha
5º Caxias do Sul

Produção de mosto de uva (2023)
1º Bento Gonçalves
2º Flores da Cunha
3º Farroupilha
4º São Marcos
5º Monte Belo do Sul

Fonte: Secretaria Estadual da Agricultura do RS
Fonte: Jornal do Comércio
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